quatro minutos depois das sete

hora de partida para outro lado qualquer...

terça-feira, fevereiro 14, 2006

Não é Rãs, é Couto de Dornelas III

Aqui fica a minha referência ao super amigo Xavier Barreto. Para ti e para a tua Aldeia de Astérix um bem haja!
"E a Gália aqui tão perto"
"Uma «terra de ninguém» desafia os céus, o padre, a diocese e a política para honrar São Sebastião e banquetear-se com a vida. E tudo começa, noite dentro, à volta do... «potedo»"

Miguel Carvalho (texto) e Lucília Monteiro (fotos) / VISÃO nº 673 26 Jan. 2006

"Dornelas não é Minho nem é Barroso. «É terra de ninguém», dizem os de cá. Com leis próprias. Chega-se a estas paragens por Cabeceiras de Basto, sempre subindo, sempre às curvas. Em tempos idos, toda a cáfila de criminosos, foragidos e assaltantes vinha cá parar à sombra do privilégio régio de um nobre cavaleiro. Aires, de seu nome, raptou uma dama da corte de Afonso Henriques e fez de Dornelas couto e pousio, povoando-a e erguendo capela. Todos os que a ela se acoutassem não podiam ser presos nem punidos pela justiça do rei. E foram ficando. Hoje, a terra com pouco mais de 500 almas gosta de levar a história a peito. Politicamente, Dornelas resiste ainda e sempre ao invasor. É a única freguesia do concelho de Boticas que não é coutada do PSD, mas sim de uma lista de independentes presidida vai para três mandatos por um jovem de 29 anos, tocador de bombardino na banda filarmónica local e boa disposição em figura de gente. «Isto aqui é a Gália e sou eu que tenho o segredo da poção mágica», garante, galhofeiro, dando as boas-vindas e lamentando não ter Astérix ou Obélix ali à mão para ilustrar o que diz.Da Câmara não vem um cêntimo para a banda, a escola de música ou outras urgências a bem da terra. Mas Xavier Barreto já ganhou as eleições por quatro, treze e quinze votos. Quem tem António Loiro, o homem das sondagens, não precisava temer. «Se eu sonhar com pastagens na noite anterior às eleições, é certinho e sabido que ganhamos.» Foi o caso.Mas as últimas eleições deram a Xavier um gozo pegado: o PSD foi a França buscar perto de 70 emigrantes para pôr fim à rebeldia de Dornelas, mas as contas do merceeiro, fosse qual fosse, saíram furadas. Sabendo do preparo da desfeita, vieram outros no encalço, lá da terra dos franciús, repor a tradição nos boletins de voto. Comunitária do forno aos afectos, Dornelas vai assar um vitelo lá mais para o Verão para assinalar o feito. Tudo por conta da brigada voluntária que se meteu no avião lá na estranja e manteve inviolável a terra que, no dizer do presidente da junta, «acredita no Cristo e nos santos, mas não tem fé nenhuma em Deus e nos padres».Entre o céu e a terraOra, nos últimos dois anos, Dornelas desafiou também quem manda nas alturas. E os seus representantes na terra. O padre e os paroquianos desentenderam-se por causa de São Sebastião, mas a isso já lá vamos, que a história é mesmo de bradar aos céus e chegou à barra do tribunal. Enquanto a procissão vai no adro, explique-se que a festa rija em honra do santo que a lenda diz ter protegido o povo da fome, peste e guerra trazidas pelas invasões francesas se celebrava, sem mácula, a 20 de Janeiro. Celebrava-se e celebra-se, pois este ano não ia ser excepção, nem que o sagrado tossisse. A ela acorre gente das redondezas e de muitas lonjuras. São aos milhares os excursionistas de talheres e garrafão à cata da oferenda de carne, arroz e pão. Tudo disposto ao longo de uma mesa estreita com toalha de linho que, este ano, teve 500 metros de comprimento, começando no centro da terra e acabando encosta acima. Ornamentaram o banquete 400 quilos de carne de porco, cem quilos de arroz e 1 012 pães de milho, centeio e trigo – de dois a três quilos cada um – custeados pelos indígenas e propiciando tal sinfonia de maxilares e lamber de beiços que até o Diabo se riu. Melhor fora que não o fizesse, pois, como diz avisada voz anciã, «estas gentes comem o Inferno e quantos diabos lá há».Tudo estaria nos eixos, não fosse o amuo com o divino, na sua forma terrena de batina, carne e osso. Diz--se que o padre teima em tomar conta da «Casa do Santo», da festa e das oferendas a São Sebastião, argumentando que a Igreja é dona e senhora da casa e Deus, nas alturas, da celebração religiosa. A população tem outra partitura para o diferendo: diz-se proprietária da dita «Casa do Santo», construída a expensas de alguma da gente mais pobre da terra e lamenta-se de, em anos anteriores, ter de pagar 45 contos ao pároco «por duas horas de missa, procissão e bênção dos alimentos». Se o padre não serve para unir as gentes desavindas, «que se foda lá ele e mais a religião dele», desabafa-se, a quente.O presidente da junta, porém, tentou levar a coisa por bom caminho. Escreveu carta à diocese de Vila Real pedindo outro pároco para honrar as festividades que aí vinham. «A vontade unânime do povo» da freguesia foi entendida na hierarquia local da Igreja como desfaçatez. Que não se metesse ele nos assuntos religiosos, foi a recomendação assinada pelo vigário-geral. «Não o deve fazer pelos mal entendidos que arrasta consigo, usurpando uma competência do Pároco e da Fabriqueira Paroquial canonicamente erecta.» Qualquer correspondência futura, será, pois, entendida como arrogância. «Este padre só nas parafundas dos infernos com um camião de torgos a arder. Ele até dá vontade de pecar», lamenta-se Maria Celeste Pedreira, mais devota da terra do que de outras divindades.A festa, sagradinhaNada a fazer. Este ano, o padre voltou a fechar o santo na Igreja a sete chaves, mas a réplica comprada por mais de 600 euros com o contributo do povo compareceu à chamada. No resto, o cerimonial manteve-se. À meia-noite, na dita «Casa do Santo», São Sebastião, cravejado de setas, assistiu aos preparativos, já o pão – do qual se diz ter propriedades curativas não se sabe bem de quê – repousava em filinhas distribuídas por seis estantes.No meio dos potes reunidos – o «potedo»... –, junta-se lenha e a carqueja que dará, noite fora, labareda de fazer bufar aqueles recipientes e quase derreter as lâmpadas. A cozedura da carne ganha lume sério a partir das cinco da manhã. João Barreto, um dos mordomos, coordena as operações enfrentando o fumo e umas horas depois hão-de chegar mais homens e mulheres como Soledade Santos que, aos 63 anos, se junta a outras da sua idade e mais novas, para peneirar madrugada dentro e até o sol desmaiar, haja bocas para comer.A carne coze nos potes. Pela manhã, os primeiros nacos de pão e carne são o pequeno-almoço de quem trabalha. A sopa de arroz, feijão, massa e cebola borbulha na água da cozedura da carne e é servida antes que tudo comece. O arroz vai aos potes na mesma água que cozeu a carne.Ao meio-dia, já o povo atulhou a «Casa do Santo», assistindo aos últimos preparativos. De Igreja trancada, santo detido e padre às avessas, a réplica de São Sebastião dá as boas-vindas aos visitantes e agradece as oferendas. Da capela situada à entrada da terra sai então a procissão. A cena é fellinesca. Não há padre nem beatice pegada. Zé, «o mudo», paramentado, leva o santo. Uns galegos trotamundos, vindos de Lugo para fazer roteiros turísticos, tiram fotografias. «Bendito Sebastião, sende o nosso protector», cantam as mulheres, enquanto rosnam outras: «Enganam toda a gente.» A procissão desce, lenta, até ao centro da freguesia e à sua passada os homens param de lascar o presunto, enquanto tiram o chapéu, em sinal de respeito. Na «Casa do Santo», Leonel, um dos mordomos, faz as vezes do padre. Benze o pão, a carne e o arroz. «E que ele nos sirva de remédio para o corpo e para a alma», diz, enquanto o presidente da junta monta uma banca à porta da «Casa do Santo», com computador portátil e colunas de som a debitar a música da banda da terra. Vai começar a vender o conjunto de garfo, faca, colher e canivete com carimbo de Couto de Dornelas, seis euros cada.Segue-se o repasto, ao ar livre, por entre cantares e pândega. Pede-se esmola para o mártir, «vamos lá rapaziada, puxem por essas carteiras?». Tabuleiros de arroz vêm e vão a uma velocidade estonteante, de olhos arregalados e mãos besuntadas erguem-se malgas de vinho. Ao povo, junta-se Alberto, moçambicano, ali radicado há 34 anos, «um dos melhores tocadores de tuba de Trás-os-Montes e arredores». O Xáxá de Boticas, João Ferreira, outrora «um dos melhores lançadores de malha da região», figura popular e atrevidota, quase cego, vai dizendo: «Isto não é uma festa, é uma recordation.» Na terra à qual, em tempos, chamaram «freguesia vermelha», bebe-se, come-se, canta-se e ri-se. Religiosamente. Se o profano é isto, ora digam lá que não é remédio santo!"


7 Comments:

  • At 31/7/08 16:40, Anonymous Anónimo said…

    eh,eh,eh,...
    O que me ri com a história eu José Pedro Dornellas de meu nome e apelido cansado de ouvir tretas à volta do " bom nome da Família" e da coutada e da cor do sangue. Afinal a caça era outra e se me posso colar a alguma coisa que seja a esta versão lusa de aldeia de gauleses que tão bem me receberam no ano passado. Afinal a minha tendência refilona e insubordinada já tem explicação.
    Assim tá bem

     
  • At 20/1/09 15:20, Anonymous Anónimo said…

    O PADRE DESSA FRAGUESIA DEVIA LEVAR UM TIRO

     
  • At 22/1/09 21:49, Anonymous Anónimo said…

    Esse padre dessa freguesia, devia ter vergonha do dinheiro que roubava aos paroquianos. Deve estar rico!!!!!! lool

     
  • At 22/1/09 21:49, Anonymous Anónimo said…

    Esse padre dessa freguesia, devia ter vergonha do dinheiro que roubava aos paroquianos. Deve estar rico!!!!!! lool

     
  • At 22/1/09 21:49, Anonymous Anónimo said…

    Esse padre dessa freguesia, devia ter vergonha do dinheiro que roubava aos paroquianos. Deve estar rico!!!!!! lool

     
  • At 22/1/09 21:49, Anonymous Anónimo said…

    Esse padre dessa freguesia, devia ter vergonha do dinheiro que roubava aos paroquianos. Deve estar rico!!!!!! lool

     
  • At 21/5/09 21:46, Anonymous Anónimo said…

    Eh Eh Eh o padre é maluco...

     

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