Na Terra
Já próximo de Goianinha o número de habitações à beira da estrada começa a aumentar consideravelmente, assim como o número de crianças que de pé descalço, seminuas, com os cabelos embaciados pela poeira do recreio, brincam alegremente e se detêm com olhar fixo para os carros que passam. São também abundantes as barrigas de vários e notórios meses. Os adultos exibem uma calma invejável e na tarde desse Sábado eram muitos os que se mostravam baloiçando-se nas omnipresentes redes, conversando em grupos ao redor de mesas improvisadas ou sentados nos degraus das casas. O cenário simples das casas mais ou menos vergadas pelo tempo e pela pobreza da construção à mistura com os tons de verde que se exibem por toda a parte fruto da vegetação generosa que parece brotar em cada espaço deixado livre, é apenas quebrado pela presença em cada uma dessas casas, praticamente sem excepção, de uma antena parabólica. Novo, o nosso guia, o homem que no aeroporto me esperava de folha A4 na mão com o meu nome escrito antecedido do prefixo Mr. – o que me deu uma enorme vontade de rir – fazia questão em notar que “a antena é mais cara que a casa!”
Ao seu lado Carlos, o condutor, mecânico de aviões da FAB e trabalhador do turismo por necessidade que o salário de sargento em fim de carreira é ao que tudo indica e segundo o próprio, magro, exibia orgulhosamente uma foto sua pousando sentado no cockpit de um F-16 Venezuelano. “Esse não posso dizer que seja meu porque não é do Brasil” dizia.
Novo lá ía dizendo que o estilo de vida de muitos dos homens da região se fazia ao sabor e em resposta às flutuações dos recursos disponíveis para o consumo de cachaça. Quando não há dinheiro para a bebida trabalha-se – na agricultura, na pesca, na construção - , para aí durante uma semana, acumula-se o suficiente, apanha-se um monumental porre e a seguir não se aparece para trabalhar durante uns dias. Depois o ciclo recomeça, sem drama porque as aspirações não são muitas e os dias vivem-se um de cada vez.